Família Dominicana

Comentário às Leituras Dominicais (Jun. 2023) por fr. José Nunes, op

 
4 Junho – Santíssima Trindade - Ano A

 

S. Tomás de Aquino escreveu milhares de páginas sobre Deus e, contudo, confessou: de Deus sabemos mais o que Ele não é do que o que é. De facto, da natureza de Deus sabemos bem pouco… Mas acreditamos muito! E essa fé confessamo-la e explicitamo-la a partir das nossas experiências humanas, o que nos conduz à afirmação de que Deus é uma Santíssima Trindade: temos a realidade dos pais que nos dão a vida e amam e, então, dizemos que Deus é nosso Pai e nossa Mãe – porque nos dão a vida e amam; temos a necessidade de conviver com amigos, companheiros de jornada e de lutas, então dizemos que Jesus é o nosso amigo e companheiro por excelência, é o nosso irmão mais-velho, Filho de Deus (como nós o somos, à nossa maneira); temos a necessidade de sentido para a vida, de alegria, coragem e força interior, então dizemos que Deus é um Espírito (Santo), que vive em nós para nos oferecer tudo isso.

Por outro lado, ao confessarmos um só Deus mas em três pessoas, estamos a afirmar que Deus é uma comunidade de pessoas, é uma família. O que nos desafia a uma vida também divina entre nós: vivermos em família de amor.

A primeira leitura, do livro do Êxodo, anuncia um Deus clemente e compassivo, rico em misericórdia. É uma compreensão de Deus muito próxima da que nos é apresentada por Jesus e em todo o Novo Testamento: o Deus cristão não é justiceiro, vingativo, polícia ou vigilante, castigador (como aparece noutras religiões ou na distorção da nossa própria religião cristã). Ele é bom e só quer o nosso bem e felicidade.

Na segunda leitura temos uma fórmula trinitária (e essas fórmulas são bem raras na Bíblia…). O que nos lembra que Deus é família e pede para vivermos em família, essencialmente com três características: alegria, amor e paz. Haverá algo de mais maravilhoso? Poderemos alguma vez ser mais felizes vivendo de outro modo?

O evangelho confirma-nos nessa fé num Deus bom, compreensivo e amigo dos seres humanos: Deus enviou o Seu Filho ao mundo para viver connosco (é Emanuel – Deus connosco), partilhar as vicissitudes históricas de toda e qualquer vida, acompanhar-nos em todos os momentos da nossa peregrinação na terra. Deus não enviou o Seu Filho para condenar mas para salvar. Deus não condena. Deus ama e perdoa. Nós é que quando nos afastamos de Deus (do amor, da paz) nos condenamos ao inferno em que a vida se torna.

29/05/2023

Artigo do fr. Bento Domingues, op


Sonhos do Universalismo Cristão

 


   1. Podemos chamar etiologias míticas às narrativas que tentam explicar a origem de certas crenças, costumes, rituais, memórias, acontecimentos e monumentos que escapam à evidência racional. A Torre de Babel, de que fala a Bíblia (Génesis 11, 1-9), situa-se nesse universo mítico. As dificuldades que a multiplicidade das línguas nos causa seria um castigo divino.   O melhor é começar por ler essa célebre narrativa: «Em toda a Terra, havia somente uma língua e empregavam-se as mesmas palavras. Emigrando do oriente, os homens encontraram uma planície na terra de Chinear e nela se fixaram. Disseram uns para os outros: vamos fazer tijolos e cozamo-los ao fogo. Utilizaram o tijolo em vez da pedra e o betume serviu-lhes de argamassa. Depois disseram: vamos construir uma cidade e uma torre, cujo cimo atinja os céus. Assim, havemos de nos tornar famosos e evitamos que nos dispersemos por toda a superfície da Terra».   Ficamos com a ideia de que Deus ficou assustado com esta ousadia dos seres humanos que ambicionavam transformar-se em seus rivais.   «O Senhor reagiu: Eles constituem apenas um povo e falam uma única língua. Se principiaram desta maneira, coisa nenhuma os impedirá, de futuro, em realizarem todos os seus projectos. Vamos, pois, descer e confundir de tal modo a sua linguagem que não consigam compreender-se uns aos outros.   «E o Senhor dispersou-os dali por toda a superfície da Terra e suspenderam a construção da cidade. Por isso, foi-lhe dado o nome de Babel, visto ter sido lá que o Senhor confundiu a linguagem de todos os habitantes da Terra e foi também dali que o Senhor os dispersou».   Este mito etiológico não vem apenas na Bíblia. Esta recebe-o da cultura ambiente. Tem paralelos sumério e assírio, greco-romano e outras tradições antigas[1]. Está colado à experiência humana muito dolorosa de querer comunicar com outros seres humanos e não conseguir por causa de línguas diferentes.   Vendo bem, o que parece assustar a Deus é a destruição da diversidade humana: não aceita uma só língua para todos os povos. É uma apologia da diversidade e do apreço por todas as diferenças culturais. A tendência para a uniformidade é imperialista, totalitária, elimina a diferença em favor do mais forte, do mais poderoso.   Já me referi, várias vezes, a um texto exemplar de J. P. Audet, um grande exegeta, no qual sustenta que, na Bíblia, não existe o equivalente do mito de Prometeu tal como este vem apresentado em Hesíodo e Ésquilo.   Nesse mito, os deuses escondem aos seres humanos o segredo da vida feliz. Aquilo que os seres humanos precisam para fazer a sua vida, por sua conta e risco, o fogo (ciências e técnicas), tem de ser arrancado aos deuses contra a sua vontade, como o fez Prometeu. Deuses e seres humanos são rivais. A felicidade dos deuses é a desgraça dos seres humanos e a felicidade dos seres humanos é uma usurpação aos deuses. Nada disto na Bíblia. Aí, a terra é dada ao homem e à mulher para que a dominem e façam dela a sua morada.   A pastorícia, a agricultura, a música, as técnicas, os negócios, as ciências e a sabedoria não são roubos a Deus. São acontecimentos normalíssimos, embora não assim o trabalho escravizante, fruto de um ser humano que se desorienta e desorienta a vida toda, que se perde do seu irmão e perde o seu irmão[2].   2. Estamos a celebrar a festa cristã do Pentecostes. Conheci muito bem uma leitura que contrapunha radicalmente o mito de Babel ao Pentecostes cristão. Era só este o defensor da diversidade. Na leitura que acabei de fazer, este contraste fica muito atenuado.   O Pentecostes cristão inscreve-se numa tradição judaica, numa festa agrícola, na qual, é celebrada a entrega dos Dez Mandamentos no Monte Sinai (a Lei), 50 dias depois do Êxodo.   Para S. Lucas, os Actos dos Apóstolos são a primeira história da Igreja. É o próprio Lucas que o conta.   «No meu primeiro livro, ó Teófilo, narrei as obras e os ensinamentos de Jesus, desde o princípio até ao dia em que, depois de ter dado, pelo Espírito Santo, as suas instruções aos Apóstolos que escolhera, foi arrebatado ao Céu»[3].   «Quando chegou o dia do Pentecostes, encontravam-se todos reunidos no mesmo lugar. De repente, ressoou, vindo do céu, um som comparável ao de forte rajada de vento, que encheu toda a casa onde eles se encontravam. Viram então aparecer umas línguas, à maneira de fogo, que se iam dividindo, e poisou uma sobre cada um deles.   «Ficaram todos cheios do Espírito Santo e começaram a falar outras línguas, conforme o Espírito lhes inspirava que se exprimissem. Ora, residiam em Jerusalém judeus piedosos provenientes de todas as nações que há debaixo do céu. Ao ouvir aquele ruído, a multidão reuniu-se e ficou estupefacta, pois cada um os ouvia falar na sua própria língua. Atónitos e maravilhados, diziam: Mas esses que estão a falar não são todos galileus? Que se passa então, para que cada um de nós os oiça falar na nossa língua materna? (…) Ouvimo-los anunciar, nas nossas línguas, as maravilhas de Deus!   «Estavam todos assombrados e, sem saber o que pensar, diziam uns aos outros: Que significa isto? Outros, por sua vez, diziam, troçando: Estão cheios de vinho doce.   «De pé, com os Onze, Pedro ergueu a voz e dirigiu-lhes então estas palavras: Homens da Judeia e todos vós que residis em Jerusalém, ficai sabendo isto e prestai atenção às minhas palavras. Não, estes homens não estão embriagados como imaginais, pois, apenas vamos na terceira hora do dia. Mas tudo isto é a realização do que disse o profeta Joel: Nos últimos dias, diz o Senhor, derramarei o meu Espírito sobre toda a criatura. Os vossos filhos e as vossas filhas hão-de profetizar; os vossos jovens terão visões e os vossos velhos terão sonhos»[4].   Sem a subversão da festa judaica do Pentecostes – da Lei do Sinai – não haveria a festa aberta a todos os povos de todas as línguas e culturas. É o anúncio da única globalização desejável, a do Espírito que tudo fecunda, sem nada apagar.   3. O Evangelho de S. João, ao terminar, adverte: «Jesus realizou muitos outros sinais na presença dos discípulos, que não estão escritos neste livro. Mas estas coisas foram escritas para que acrediteis que Jesus é o Cristo, o filho de Deus e, para que, acreditando, tenhais vida em nome dele».   Este Evangelho concentrou tudo no dia de Páscoa: «Ao entardecer no mesmo dia, primeiro da semana, e estando as portas trancadas onde estavam os discípulos devido ao medo dos judeus, veio Jesus e pôs-se de pé no meio deles e diz-lhes: Paz para vós. E dizendo isto, mostrou-lhes as mãos e o lado. Então os discípulos alegraram-se ao verem o Senhor. Jesus falou-lhes de novo: Paz para vós. Tal como o Pai me enviou, eu envio-vos a vós. E dizendo isto, soprou e diz-lhes: Recebei o Espírito Santo».   O seu Pentecostes deve tornar-se a missão da Igreja entre todos os povos, de todos os tempos. É o sonho do universalismo cristão!     Fr. Bento Domingues in Público, 28/5/2023   _____________ [1] Cf. Wikipédia [2] Cf. J. P. Audet, La revanche de Promété ou le drama de la religion et de la culture, Rev. Biblique, 73 (1964) 5-29 [3] Act 1, 1-2 [4] Act 2, 1-17
28/05/2023

Presença Dominicana em Angola

Novo vídeo com o testemunho do Fr. José Nunes, OP nos 40 anos da presença dominicana em Angola (Waku-Kungo).

11/01/2023

JORNADAS DA FAMÍLIA DOMINICANA - 2022

26/11/2022

Exposição de Arquitectura

10/06/2018