Família Dominicana

Comentário às Leituras Dominicais (Nov. 2025) por fr. José Nunes, op

 
23 DE NOVEMBRO - CRISTO REI - ANO C

 

Jesus é Rei. Certamente. Contudo, esta confissão de fé carece de algum cuidado na sua formulação e compreensão. De facto, Jesus proclamou o Reino de Deus, disse que o Reino de Deus já estava presente onde Ele também estava, a Pilatos respondeu afirmativamente quando lhe perguntaram se era rei, na cruz aparece o atributo ‘rei dos judeus’. Por outro lado, Jesus disse a Pilatos que o seu reino não era deste mundo, aos discípulos pediu várias vezes que não fossem como os reis e chefes deste mundo, Ele próprio nunca teve exército (como é próprio de todos os reis da terra) e até ordenou a Pedro que guardasse a espada…

Jesus, então, é rei, mas um rei especial. A realeza sempre é sinónimo de ‘maior’, de ‘superlativo’. Então sim, Jesus é o rei do amor (ninguém amou mais do que Ele), é o rei do serviço (ninguém se colocou mais ao serviço dos outros do que Ele), Ele reina nos nossos corações (na medida que é a Ele que nós queremos seguir e servir (a mais nenhum rei, presidente ou governante da terra), Jesus é rei enquanto Bom Pastor, Jesus reina, desde o céu (junto do Pai), para que nenhum poder do mal possa destruir a maravilhosa obra da criação, para que o mal não possa vencer definitivamente o bem!

17/11/2025

Artigo do fr. Bento Domingues, op


 SERÁ A POBREZA UMA FATALIDADE?

  

1. Não falta quem diga que foi o próprio Jesus que fez da pobreza uma fatalidade: pobres sempre tereis entre vós[1]. Dizer isso é ler fora do contexto. Na sua terra, em dia de sábado na Sinagoga, Jesus apresentou como programa da sua intervenção no mundo, usando palavras mais antigas, palavras do profeta Isaías 61, 1: O Espírito do Senhor está sobre mim / porque me ungiu / para anunciar a Boa-Nova aos pobres / enviou-me a proclamar a libertação aos cativos / e, aos cegos, a recuperação da vista / a mandar em liberdade os oprimidos /    a proclamar um ano favorável da parte do Senhor.

Ele suprimiu intencionalmente, na sua leitura de Isaías, a parte do texto que incluía o dia da vingança do nosso Deus. Esta não fazia parte do seu programa. Ele veio, precisamente, para suprimir a vingança, para anunciar o contrário: amai os vossos inimigos, fazei bem a que vos faz mal… O que não vai fazer parte do seu programa é a violência, a inimizade entre pessoas e povos.

Além disso, o Nazareno teria dito, segundo o testemunho do Novo Testamento (NT), esta passagem assustadora: não venho trazer a paz, mas a espada. Convém ver o que Tomás de Aquino diz acerca da paz: há uma paz, fundada na injustiça, que é preciso destruir. É uma falsa paz. A verdadeira paz, fundada no amor e na justiça, é aquela que deve ser promovida (pax delenda et pax instauranda). Sem esta distinção, atribuímos a Jesus de Nazaré uma verdadeira barbaridade incompatível com todo o NT.

2. Para o conhecido teólogo, Juan José Tamayo, Gustavo Gutiérrez, OP (1928-2024) é justamente reconhecido como o pai do novo paradigma teológico, que representou uma verdadeira revolução epistemológica, metodológica, espiritual e social no discurso religioso e na prática libertadora de cristãos e grupos com especial sensibilidade ao sofrimento da maioria popular.

Segundo este teólogo, estamos diante de uma nova maneira de fazer teologia que teve repercussões sociais e políticas, desestabilizadoras para o sistema neocolonial latino-americano e continua a tê-las, hoje, para o sistema de globalização neoliberal que o Papa Francisco define como a globalização da indiferença que nos torna indiferentes aos gritos dos outros e descreve como fundamentalmente injusto.

Não deixa de ser curioso que seja o Papa Francisco a escrever o prefácio do último livro de Gustavo Gutiérrez, Viver e pensar o Deus dos pobres.

Neste prefácio, Francisco, que tinha denunciado a economia que mata, testemunha que esta voz latino-americana, durante a sua longa vida, foi um servo fiel de Deus e um amigo dos pobres. A sua teologia marcou a vida da Igreja e ainda é actual, com um frescor que abre caminhos ao seguimento de Jesus.

Neste último livro, ofereceu-nos, mais uma vez, o fruto do seu empenho, da sua oração e da sua reflexão. Quero destacar nessas páginas a profunda e permanente fidelidade à Igreja no seu caminho. Uma fidelidade vivida com humildade, às vezes com dor e, fundamentalmente, com liberdade.

Muitos grupos cristãos estavam a viver desafios, questionamentos e esperanças que derivavam do forte clamor dos pobres e do crescente compromisso com este mundo. A irrupção dos pobres, como Gustavo a chama, exigia justiça e uma outra maneira de viver a fé, de pensar a fé, de dizer a fé, em suma, de ser Igreja. Gustavo frequentemente lembrava, oralmente e por escrito, a frase de João XXIII de 11 de Setembro de 1962, um mês antes da inauguração do Concílio: a Igreja apresenta-se como é e quer ser, como a Igreja de todos e, particularmente, a Igreja dos pobres.

A sua pergunta constante, Como podemos falar de Deus a partir do sofrimento do inocente? continua a ser premente para os crentes diante do poder da injustiça e da mentira. Os pontos centrais da sua teologia querem estar presentes onde a marca de Deus parece ter sido apagada na atmosfera cultural. Enraizada na libertação que Cristo nos oferece, a sua teologia afirma a gratuidade do amor de Deus que nos envolve na história. A teologia de Gustavo permanece na Igreja não como um belo tesouro do passado, mas como aquele segundo acto, uma tarefa sempre aberta, para pensar a nossa experiência vivida de Deus; uma experiência já iniciada e experimentada justamente ali, onde nos tornamos próximos dos feridos, abandonados à beira da estrada e de onde tentamos dizer com humildade, com terna convicção, aos mais pobres e a todos: Deus ama-te. Gustavo deu-nos as ferramentas teológicas indispensáveis para que nunca nos esquecêssemos dos pobres.

Neste último livro, deixa muito claro que lembrar-se dos pobres significa muito mais do que um peditório; não é um acréscimo piedoso. Como ensina S. Paulo, é o coração da mensagem cristã (2 Cor 8 – 9).

Em consonância com este texto, convém evocar as palavras de uma pessoa muito querida a Gustavo, Bartolomé de Las Casas, OP (1484-1566): De cada um dos pequenos e mais esquecidos, Deus guarda uma recordação muito próxima e viva.

A partir daqui, o Reino que Jesus anuncia abraça toda a criação, cada ser humano e realidade humana, em todos os tempos e lugares. É este o Deus de Jesus de Nazaré[2].

Em Portugal, no âmbito da Teologia da Libertação, Bruto da Costa, Manuela Silva e Gonçalo Pereira Diniz, OP, podem ser incorporados nesse vasto movimento internacional[3]. Quando se pensa nos pobres, é preciso nunca esquecer o Padre Américo e todas as suas iniciativas. Não fez teologia. Praticou-a.

3. George Bernanos afirmava que há cristãos capazes de se instalar comodamente mesmo debaixo da cruz de Cristo. Gustavo Gutiérrez pretende corrigir essa tendência conformista, activando as energias utópico-libertadoras do cristianismo. A sua referência intelectual é Bartolomé de Las Casas, OP, defensor dos índios e africanos escravizados pelos conquistadores e pioneiro do reconhecimento e respeito pela pluralidade cultural. Parafraseando-o (os índios morrem antes de tempo) o teólogo peruano afirma que os pobres na América Latina morrem antes de tempo.

As questões existenciais, ou melhor, vitais que queimam os lábios de Gustavo e lhe atormentam a consciência têm a ver com a linguagem sobre Deus: como falar de Deus a partir do sofrimento dos inocentes? Com a fraternidade: como falar de Deus Pai num mundo onde os seres humanos não são irmãos? E com a vida e a morte: como falar da ressurreição num mundo onde os excluídos são carne para canhão?

A pobreza não será uma fatalidade se tiver pessoas como Gutiérrez e o Papa Francisco que criem movimentos que atingem a economia que mata.

   

Fr. Bento Domingues in Público, 16/11/2025     _____________
[1] Jo 12, 8 [2] O livro, traduzido do espanhol para italiano por Marta Pescatori, foi publicado postumamente pela Editora Queriniana (Brescia 2025), segundo a notícia de L'Osservatore Romano [3] Cf. Gonçalo Pereira Diniz, OP, O clamor do “não homem”. A obra de Gustavo Gutiérrez como proposta atual de ética política e social, Universidade Católica Editora, 2020
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