Família Dominicana

Comentário às Leituras Dominicais (Dez. 2023) por fr. José Nunes, op

 
3 Dezembro – 1º Domingo do Advento - Ano B

 

O tempo litúrgico do Advento, que hoje iniciamos, apenas foi criado pela Igreja no século VI, como preparação para a grande festa e mistério da Incarnação-Natal (começada no século IV, quando se cristianizou a festa pagã do deus sol, no solstício de Dezembro). Mas os cristãos sempre viveram o Advento: de facto, nos primeiros séculos, o advento era o tempo todo da vida, era a vida toda em espera permanente da Parusia (segunda e última vinda de Cristo salvador), era um preparar-se dia-a-dia, e todos os dias, para o encontro final com Deus.

E se lembrámos aquela realidade histórica, é porque os textos do domingo de hoje nos inserem nessa perspectiva e nos desafiam a viver à maneira desses nossos antepassados na fé: nós queremos muito que Deus venha até nós… mas então preparemo-nos para isso!

«Oh, se rasgásseis os céus e descêsseis!» – exclama o profeta Isaías. Ele vive num tempo e numa cultura em que se acredita que o céu é como um tecto sobre a terra e Deus está por cima desse tecto. Deus abre brechas no céu e cai a água das chuvas, Deus pode abrir fendas no céu e descer até à terra e vir visitar os seres humanos. Então, o profeta pede e suspira para que Deus venha visitar o seu povo! E nós, cristãos, é isso mesmo que celebraremos no Natal: a vinda de Deus à nossa história e às nossas vidas.

Mas essa vinda tem de ser preparada, tal e qual como se prepara a visita de alguém de quem muito gostamos e vem a nossa casa. Por isso nos aparece, na segunda leitura e no evangelho, essa recomendação: «mantenhamo-nos firmes na espera da manifestação» de Deus (I Cor.), «estejamos acautelados e vigilantes» para a vinda do Senhor (Evangelho). Ou seja: aproveitemos o Advento para uma revisão séria da nossa vida e disponhamo-nos a mudar/converter o que de «homem velho» há ainda em nós, deixando-nos trabalhar pelo Espírito de Deus – nós que, usando a metáfora de Isaías na primeira leitura, somos como barro nas mãos de Deus, o nosso criador e oleiro.

29/11/2023

Artigo do fr. Bento Domingues, op


Natal da Alegria Para Todos 

   1. Todos os anos nasce a pergunta: o dia 25 de Dezembro é uma data histórica ou uma construção simbólica? Actualmente, a Igreja Católica, as Igrejas Protestantes e as Igrejas Ortodoxas de Constantinopla, de Alexandria, de Antioquia, da Roménia, de Chipre e da Grécia celebram o Natal no dia 25 de Dezembro. Todas as outras Igrejas Ortodoxas o celebram no dia 6 de Janeiro, quando a Igreja Católica celebra a Epifania. A Igreja da Arménia celebra o Natal a 18 ou 19 de Janeiro.

Estas datas têm todas a ver com a resistência do sol ao seu aparente apagamento e com as festas pagãs a propósito do solstício de Inverno. Os romanos festejavam, a 25 de Dezembro, a festa do Sol invencível, a qual foi decisiva para situar a festa do nascimento do verdadeiro Sol, luz do mundo, nossa luz, Jesus Cristo.

A palavra solstício significa "sol parado". A partir desta data, a duração do dia começa a crescer. Por isso, na antiguidade greco-romana, o solstício de inverno simbolizava a vitória da luz sobre a escuridão.

As narrativas evangélicas da infância de Jesus são diferentes em Mateus e em Lucas e a sua poética também. Mas, quer uma quer outra, significam sempre o Natal de Jesus ou, como escreveu S. Mateus, Deus-connosco. Esta significação é extensiva às outras narrativas do Novo Testamento. Todas dizem que Deus está com todas as pessoas, de todos os povos, para que todas possam renascer, tornar-se cristãs. O universalismo cristão tem, aqui, a sua fonte.

Não vou entrar nos problemas da evolução histórica desta convicção cristã. Mas não vale tudo. Alguns dos chamados novos movimentos religiosos, que se apresentam para renovar a Igreja, tornaram-se os seus maiores problemas – idolatria, abuso de poder, escândalos sexuais. Como prevenir esta deriva sectária e os seus abusos?[1].

2.  A própria existência de vários textos fundadores da fé cristã mostra que não são a cópia uns dos outros. Mesmo os chamados quatro Evangelhos foram precedidos da convicção de Cristo actuante na diversidade cultural das diferentes comunidades. Foram surgindo em contextos sempre novos da evangelização, desde os primeiros tempos.

A criatividade, no interior das comunidades cristãs, foi considerada fruto do Espírito de Cristo que suscita não só a diversidade, mas também a sua unidade. Criatividade, unidade e diversidade viveram sempre em tensão em todos os tempos e lugares.

Os cuidados com a ortodoxia não podem tentar sufocar a liberdade do Espírito de Deus porque foi para a liberdade que Cristo nos libertou. Paulo insiste em não nos deixarmos prender, de novo, ao que nos escravizou[2]. Podemos ouvir, hoje, esse grande aviso no coração dos próprios trabalhos do sínodo em curso. Este só tem sentido se for para abrir o presente à liberdade de Deus na criatividade da Igreja. Não se pode meter vinho novo em odres velhos. Por isso, não nos admiremos dos movimentos tradicionalistas que nunca desejaram o novo, mas o velho. Não podemos esquecer que é preciso um discernimento constante para não confundir as verdadeiras com as falsas reformas, como diria Yves Congar[3].

3. Desde há bastante tempo que o Natal se tornou uma festa de família, que deveria ser para todas as famílias, considerem-se elas cristãs ou não. Os próprios laços familiares vão mudando de sentido com as transformações da própria família ou da ausência de família por doenças, guerras ou catástrofes. Daí, a diversidade das suas festas: Natal dos hospitais, das prisões, dos sem abrigo e das múltiplas iniciativas das mais diferentes instituições. Ao contrário do que muitas pessoas julgam, não me parece que se devam desvalorizar essas iniciativas com o pretexto de que não resolvem problema nenhum e servem, apenas, para criar momentâneas ilusões.

No entanto, os cristãos não podem esquecer que o nascimento de Jesus é apresentado, em S. Lucas, como a festa dos que não frequentavam o Templo ou as Sinagogas – os pastores que cuidavam dos seus rebanhos, mesmo durante a noite. Vale a pena escutar esse texto:

«Um Anjo apareceu-lhes e a glória do Senhor envolveu-os de luz e ficaram assustados.      O Anjo disse-lhes: Não tenhais medo, pois anuncio-vos uma grande alegria, que o será para todo o povo.      Hoje, na cidade de David, nasceu-vos um Salvador, que é o Cristo-Senhor.      Isto vos servirá de sinal: encontrareis um recém-nascido envolto em panos e deitado numa manjedoura.      De repente, juntou-se ao Anjo uma multidão do céu, louvando a Deus e dizendo:      Glória a Deus nas alturas e paz na terra a todos os seres humanos, de todos os tempos e lugares!»[4].

É seguindo esta lógica que o Papa Francisco acaba de nos lembrar: o anúncio cristão é alegria para todos! Quando nos encontramos verdadeiramente com o Senhor Jesus, a maravilha deste encontro invade a nossa vida e pede para ser levada além de nós mesmos. É isso que Ele deseja, que o seu Evangelho seja para todos. Com efeito, nele existe um “poder humanizador”, um cumprimento de vida destinada a cada homem e mulher, porque Cristo nasceu, morreu e ressuscitou para todos. Para todos, sem excluir ninguém!»

Mas observa: «Talvez que a maior tentação consista em considerar o chamamento recebido como um privilégio. Por favor, não! O chamamento não é um privilégio, nunca! Não podemos dizer que somos privilegiados em relação aos outros, não! O chamamento é para um serviço. E Deus, quando escolhe alguém, é por amor de todos e para ir ao encontro de todos!

Também para evitar a tentação de identificar o cristianismo com uma cultura, com uma etnia, com um sistema. Desse modo, perderia a sua natureza verdadeiramente católica, isto é, para todos, universal. Não é um grupinho de eleitos de primeira classe. Não nos esqueçamos: Deus escolhe alguns para todos. É este o horizonte da universalidade. O Evangelho não é só para mim, é para todos, não o esqueçamos».

Como já tinha escrito na Evangelli gaudium (nº 14), «todos têm o direito de receber o Evangelho. Os cristãos têm o dever de o anunciar, sem excluir ninguém, e não como quem impõe uma nova obrigação, mas como quem partilha uma alegria, indica um horizonte maravilhoso, oferece um banquete apetecível. A Igreja não cresce por proselitismo, mas por atração».

«Irmãos e irmãs, sintamo-nos ao serviço do destino universal do Evangelho, que é para todos, e distingamo-nos pela capacidade de sair de nós próprios. Para ser verdadeiro, o anúncio deve-nos fazer sair do egoísmo e ter a capacidade de superar todos os limites»[5].

As festas do Natal anunciam e denunciam o Natal que falta!



    Fr. Bento Domingues in Público, 26/11/2023   _____________ [1] Cf. Manuel Pinto, Novos movimentos religiosos: como prevenir a deriva sectária e de abusos?, 7Margens, 20.11.2023. [2] Gal 5, 1 [3] Vraie et fausse reforme dans l’Église, Cerf, Paris, 1950 [4] Cf. Lc 2, 1-20; ver genealogia de Jesus: Lc 3, 23-38 [5] Cf. Audiência de 22.11.2023, www.vatican.va 
26/11/2023

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